Travessia da Serra Fina Invertida

Relato da Travessia da Serra Fina invertida realizada em 4 dias, com início no Sítio do Pierre (Itamonte/MG) e fim na Toca do Lobo (Passa Quarto/MG). De grau difícil oferece certa dificuldade quanto a orientação, com exceção da trilha que desce o Capim Amarelo.


Vista do Cupim do Boi durante a travessia da Serra Fina invertidaLocal: Serra Fina
Data: Junho/2015
Percurso: Sítio do Pierre – Toca do Lobo
Distância: 28 km
Tempo: 4 dias
Participantes: Keila Beckman, Daniela Ferrer, Emerson Fonseca e Ramon Quevedo
Grau de dificuldade: Muito difícil


1° Dia: Sítio do Pierre – Acampamento Base Pico dos Três Estados

Crista até o Pico dos Três Estados no primeiro dia da travessia da serra fina invertida
Crista até o Pico dos Três Estados no primeiro dia da travessia da serra fina invertida

As 7:00 da manhã o Sr. Mariomilton, com quem acertamos o nosso resgate, nos pegou no Hostel Picus, onde pernoitamos, e nos levou até o Sítio do Pierre, onde iniciamos a travessia da Serra Fina invertida as 8:00.

A trilha segue por entre a mata bem aberta, mas no decorrer da subida  a mesma vai sendo tomada pela vegetação até o ponto de você não enxergar mais onde pisa. Porém, apesar disso,  o caminho é óbvio. É como se fosse uma estradinha estreita  cheia de mato no meio. E o caminho segue assim até o único ponto de água do dia.

Do Pierre até o ponto de água levamos 40 minutos. Abasteci com 3,5 litros de água (1,5 L para beber nesse dia, 0,5 L para cozinhar e 1,5 L para beber no dia seguinte), porém deveria ter pego mais.   Numa próxima vez levarei 4L ou 4,5L, pois no final do dia acabei ficando só com 1 L para o dia seguinte inteiro. Se não fosse o Ramon e o Emerson subirem com  5 litros cada, certamente eu teria passado sede.  Acabei utilizando a água deles que sobrou.

Seguindo a trilha, após a bica de água, tivemos  nosso primeiro encontro com os tão temidos bambus.

Ouvi muitos dizerem que o que dificultava a travessia da Serra Fina invertida eram os bambus, que estariam virados para baixo, apontados como lanças, para quem subia pelo sentido inverso. Eu particularmente não vi bambu algum apontado para baixo como lança, como dizem por aí. Eu simplesmente vi  bambus no meio do caminho, da mesma forma como estão na rota normal. Só que, empurrar bambu  para baixo, quando se está descendo,  é muito mais fácil que empurrar bambu para cima, quando se está subindo. O esforço para subir com uma cargueira já é grande, imagina subir tendo, a todo tempo, que fazer esforço para se livrar de algo que impede a sua passagem. Imagina ainda, conseguir se livrar dos que estão a sua frente,  mas a cada passo dado um, dois, três te segurarem pela cargueira; a cada passo dado ser surpreendido com  um solavanco que irradia diretamente para o teu joelho. Sem dúvida alguma isso foi bem desgastante.

Passada essa primeira etapa dos bambus, saímos numa área aberta,  com capins e seguimos subindo, ora por entre áreas abertas com capim,  ora por entre matas com bambus, até chegarmos a uma grande laje de pedra, que segue subindo até o Alto dos Ivos, onde chegamos as 14:00. Dali podíamos avistar o Pico dos Três Estados, que ainda se encontrava bem longe (saindo as 15:00 no máximo, prevíamos chegar aos Três Estados por volta das 18:00).

A essa hora já estávamos exaustos. A constante subida, e a dificuldade enfrentada com os bambus, esgotou as nossas energias. Fizemos então uma pausa prolongada para almoçar e descansar, no Alto dos Ivos.

As 15:00, conforme planejado, iniciamos a descida do Alto dos Ivos  rumo aos Três Estados, momento em que comecei a sentir uma dor bem forte no joelho (uma dor que aparece sempre que eu faço um esforço muito grande com muita carga)

Descemos um vale, subimos uma montanha, descemos outro vale, subimos outra montanha ainda maior, descemos novamente, s ora em meio ao capim, ora em meio ao bambu, e as 17:00, já sem nenhum energia chegamos a uma área de camping (espaço para umas  4 barracas) onde resolvemos ficar, pois ainda faltavam pelo menos 1 hora e meia até o cume  dos Três Estados. Não dava para continuar a caminhada no estado em que estávamos, pois certamente levaríamos muito mais tempo. Continuar significaria fazer trilha no escuro e correr o risco de nos perder em meio ao capim lá de cima.

Foram 9 horas de caminhada pesada (contando as  poucas pausas que fizemos) até aqui. Durante todo o dia só encontramos com um grupo de 3 pessoas fazendo também a travessia da Serra Fina invertida, as quais nos ultrapassaram e logo sumiram das nossas vistas após o Alto dos Ivos.

Não cumprimos, o objetivo do dia, que era acampar no cume dos Três Estados, mas agimos de forma sensata ante as condições que se apresentavam.

A primeira coisa que fizemos quando chegamos foi sentar no chão para descansar, mas logo começamos a sentir a temperatura despencar muito rápido e, antes de armar a barraca, colocamos roupas quentes.

Enquanto montávamos acampamento avistamos várias luzes descendo o Alto dos Ivos. Outro grupo bem maior, que acabou acampando entre o Ivos e o primeiro vale.  Não me lembro de nenhuma área descente para se acampar por ali.

O pôr do sol não teve o sol se escondendo dos nossos olhos, mas teve toda a beleza de suas cores no céu. Apreciamos um pouco e fomos descansar dentro da barraca. Não demorou muito já começamos a ouvir o ronco do Emerson, que já havia capotado.

Ramon então foi agilizar o jantar, para podermos dormir logo. Assim como o Emerson, estávamos todos muito cansados. Precisávamos descansar bem pois o dia seguinte seria muito mais puxado do que prevíamos, já que não cumprimos a meta do dia, que era acampar no cume dos Três Estados. Após o jantar apagamos.  Ramon doido bivacou naquele frio danado, e assim fez por todos os outros 3 dias.

Foi uma noite muito gelada. Dani e Emerson passaram frio a noite toda. Ramon no bivaque também reclamou que chegou ao seu limite. Já eu no meu saco -30  dormi a noite toda como um bebê,  confortavelmente.

2° Dia: Acampamento Base dos Três Estados – Vale do Ruah

Crista até a Pedra da Mina no segundo dia da travessia da serra fina invertida
Crista até a Pedra da Mina no segundo dia da travessia da serra fina invertida

Acordei por volta das 5:00, completamente sem sono e revigorada. Peguei minha câmera e fui lá para fora fazer umas fotos.. Tudo  estava congelado. A barraca, a lona que cobria as nossas mochilas, as nossas mochilas, a água do meu camelback, a minha crocs, o saco bivaque do Ramon, enfim… Tudo branquinho e lindo.

Depois que amanheceu completamente tomamos um café , desmontamos acampamento e as 9:00 partimos rumo a Pedra da Mina.  A Dani não estava muito bem, pois acabou ficando resfriada e passou a trilha inteira com o incômodo do nariz escorrendo. É claro que a gente não perdeu a oportunidade de zoar com ela.

Percebemos que tomamos a decisão mais acertada em acampar onde acampamos no primeiro dia. A subida daquele primeiro pico – que desconheço o nome – antes de iniciar a subida dos Três Estados é extremamente puxada. Certamente teria sido muito sacrificante fazê-la no dia anterior, já sem energias.

Após  chegarmos ao alto da primeira montanha que subimos no dia,  andamos um pouco em meio ao capim elefante, em um terreno praticamente plano,  e iniciamos a subida dos Três Estado, em si, bem mais leve que a primeira subida do dia. Chegamos por volta das 10:20 e fizemos uma pausa para descansar e nos alimentar.

Iniciamos a descida as 10:45, já avistando toda a linda crista que percorreríamos durante o dia.

Como  estávamos atrasados por não ter acampado no cume dos Três Estados,  Ramon previa que não daria para chegar ao cume da Pedra da Mina. Não apenas pelo tempo em sim, mas  também porque provavelmente estaríamos esgotados ao chegar ao Vale do Ruah e subir o quarto ponto mais alto do Brasil, pelo lado mais difícil, naquelas condições certamente não seria a melhor escolha.  Fora que, pelo o que tínhamos conhecimento, existia um batalhão de grupos fazendo a travessia pela rota normal, assim, certamente nem haveria mais locais para acampamento lá.  Apesar de eu ainda teimar que conseguiríamos chegar a Pedra da Mina, e tentar uma área de camping lá ou no platô logo abaixo dela,  no decorrer da caminhada fui vendo que isso realmente não seria possível.

Após descermos  os Três Estados, em meio ao capim elefante,  chegamos a área de camping do outro lado da montanha, num bambuzal .

Seguindo a trilha, subimos por entre os bambus até chegarmos a um trecho de pedra, que levava até o alto da montanha a frente, onde tinha início a longa crista que enfrentaríamos durante todo o dia.

Após a subida andamos alguns minutos no reto, e logo em seguida iniciarmos a descida do Cupim do Boi, momento em que  encontramos com o amigo Gerson Santos, que guiava um grupo na rota tradicional.

A partir de então foram  subidas, subidas e mais subidas,  alternadas com levíssimas descidas,  ora em meio aos bambuzinhos  ora em meio  ao capim elefante, que dificultavam a nossa passagem, já que tínhamos que ficar constantemente empurrando-os para cima.

Chegando  ao topo da última montanha, onde havia uma área para camping,  finalmente avistamos por completo o Vale do Ruah. Neste momento encontrei com o  Marcelo Fuzsawa, que só conhecia através da net.

Iniciamos então a descida. Nesse ponto a Dani e o Emerson foram na frente. Eu e Ramon acompanhamos os dois um pouco mais afastados. Certa hora a Dani perguntou se estávamos na trilha certa. Checamos o GPS e verificamos que tínhamos saído da trilha.

A essa hora o sol já  estava  indo embora.  Começamos então a procurar uma saída para a trilha certa. Eu ia verificando o GPS a todo momento, dando as coordenadas para a Dani que ia à frente abrindo o mato que fechava a trilha por completo.

Fiquei meio apreensiva  quando o meu GPS começou a acusar bateria fraca. Lembrei -me que havia esquecido de deixar pilhas novas a fácil alcance, assim como a lanterna. Procurá-las dentro da mochila no meio daquele capim todo fechado não foi uma opção no momento. Estávamos mais preocupados em voltar a trilha certa o mais rápido possível. A essa hora o sol já tinha ido embora, mas a lua estava lá brilhante, iluminado o nosso caminho.

Depois de muito rodar, dando sempre de cara com becos de capim sem saída a Dani decidiu varar mato, em direção a trilha correta. Nesse momento, quando ela foi pular uma moita,  apoiou a mão segurando o bastão para trás, e se eu não tivesse tido o reflexo rápido que eu tive, em bater com meu braço no bastão desviando-o de mim,   aquela ponta de ferro tinha varado o meu olho e eu certamente teria ficado cega naquele exato instante. Passei o resto da trilha pensando nisso, e  desde então tenho trilhado prestando muita atenção nas pessoas que andam com bastões a minha frente.

Depois do susto, logo caímos na trilha que deveríamos percorrer e em poucos minutos já estávamos margeando o rio. O GPS indicava que a trilha seguia sempre bem próxima ao rio, ora nas bordas do mesmo, ora em meio ao capim.

Prosseguimos então com nossa caminhada a noite, agora na trilha certa. Porém, após algum tempo andando, sem chegar a área de camping nossa amiga  Dani começou a ficar um pouco nervosa,  achando que ainda estávamos perdidos.  Tentei acalmá-la como eu pude, mostrando a ela que não havia com o que se preocupar, mostrando a ela que estávamos na trilha correta e que agora bastava segui-la até a área de camping.  Ela se acalmou um pouco, mas pediu que eu não desgrudasse os olhos da tela do GPS. E assim ela voltou novamente a dianteira abrindo os capins minha frente.

Como não havíamos pego água ainda, e estávamos sem uma gota sequer, paramos para abastecemos as garrafas. Nesse momento dois caras passaram por nós, dizendo que estavam indo até os Três Estados. Perguntamos sobre a área de camping e eles  informaram que havia uma a 50 metros de distância de onde estávamos. Ufaaaa. No tracklog que tínhamos não havia marcação desta área, que foi a primeira que encontramos no vale do Ruah, fazendo a travessia da Serra Fina invertida. Foi um alívio chegar lá e ver que tudo tinha dado certo. Abracei a Dani, que estava meio abalada com a situação de ficar perdida a noite no meio do mato,  e ela começou a chorar. Os meninos vieram logo em seguida e abraçaram a gente, num abraço coletivo. Foi muito lindo.  Trabalhamos em equipe e dei tudo certo.

Logo começamos a colocar roupas quentes para não perdermos calor  e armamos a barraca.

A Dani foi descansar um pouco e o Emerson e eu  ficamos lá fora com Ramon, ajudando com o jantar. Enquanto esperávamos preparamos uma sopinha de caneca para cada um de nós (nesse dia podíamos nos dar ao luxo pois tínhamos água em abundância bem ali, pertinho de nós).

Ramon fez uma macarronada maravilhosa. Nossa senhora… nunca comi algo tão gostoso na montanha.  Ele simplesmente ia colocando dentro tudo o que ele tinha levado (pimentão, cebola, carne moída, etc… tudo desidratado). Para completar, coloquei um pedaço de queijo minas padrão que eu levei,  que deu o toque final. Foi o jantar mais gostoso de todos os jantares que já tive na montanha.
Só se ouvia naquela hora “huuuuummm” de todos, a cada colherada. Realmente estava muito bom. Valew Ramon!!

No local havia uma barraca armada, mas sem ninguém dentro. Logo apareceu o dono: Bruno do Gente de Montanha (muito simpático por sinal) o qual nos disse que o Maximo Kaush estava  ali bem próximo com um grupo.  Os olhos brilharam…”O Máximo Kaush? Tenho que conhecer esse cara “… pensei eu.  No dia seguinte  certamente nos cruzaríamos pelo caminho pois se eles não passassem pelo nosso acampamento antes nós certamente passaríamos pelo deles, que estavam mais a frente.

Bom… jantamos, bebemos um suco tang bem gostoso e fomos dormir.

Apesar de estarmos no Ruah, local que dizem ser muito mais frio que os picos, não fez tanto frio assim. Foi bem tranquilo que a noite na base dos Três Estados. Todos dormiram bem, sem sentir um pingo de frio.

3° Dia: Vale do Ruah – Maracanã

Vale do Ruah
No vale do Ruah, seguindo para a Pedra da Mina

Acordei assim que começou a clarear e fui para fora da barraca. Nessa hora comecei a ouvir vozes e logo um grupo passou por nós  em direção aos Três Estados.

Em seguida a Dani também saiu da barraca para  ir ao “banheiro”.

Eu estava vigiando para ela, para ver se não vinha ninguém e, de repente eu comecei a ouvir o capim se mexendo e corri para a entrada da trilha para não deixar a pessoa prosseguir.  Foi nessa hora que eu dei de cara com quem? Maximo Kaush. Que situação mais engraçada de se conhecer uma pessoa… “Espera moço, você não pode passar agora… é que minha amiga está….” aí ele olha adiante, vê  a minha amiga naquela situação e abaixa a cabeça pedindo desculpas educadamente.

Ele tinha ido chamar o Bruno, que ainda dormia,  para tomar café.

Bom… foi a única hora que eu consegui falar com o Máximo. Depois tive mais duas oportunidades, mas sei lá… travei.

Depois que terminamos de tomar nosso café e estávamos arrumando as coisas para levantar acampamento o Máximo voltou para desarmar a barraca do Bruno.

Ele trocou uma ideia com o Ramon e eu, doida pra trocar umas palavras com ele também, mas não conseguia. Sei lá o que me deu. Acho que foi a emoção de estar tão perto de um montanhista que eu admiro tanto.

Tão experiente e tão humilde. Fiquei ainda mais fã dele. Pena que não consegui conversar com ele. Queria muito ter ouvido suas histórias de montanhas, mas não foi dessa vez. Quem sabe numa próxima.

Bom… mochilas arrumadas, partimos as 8:20 em direção à Pedra da Mina. No acampamento logo após o nosso encontramos com o Máximo novamente,  levantando acampamento. Demos tchau e continuamos a nossa caminhada em meio ao charco,  ao capim elefante e a toda aquela neblina que pairava sobre o vale, deixando a atmosfera muito sombria.

Logo começamos a topar com vários grupos pelo caminho, que estavam vindo da Pedra da Mina. Centenas de pessoas… todas dizendo para tomarmos cuidado na subida da Pedra da Mina, pois estava ventando muito.  E só quando chegamos lá pudemos ver realmente do que eles estavam falando.  O vento realmente estava muito forte. Rajadas nos empurravam a todo instante, nos desequilibrando. Muito me lembrou o vento a Patagônia.

Subimos a montanha devagar, tomando muito cuidado com as rajadas e sendo chicoteados  no rosto , a todo tempo, pelas tiras das alças das mochilas .

Chegamos ao cume da Pedra da Mina 2 horas depois, as 10:20. Não tivemos visual algum e logo iniciamos a nossa descida, rumo ao Maracanã. No final da descida da Pedra da Mina o tempo abriu um pouquinho e pudemos ver o belo mar de capim que há lá embaixo,  mas  o  visual não durou muito. Logo voltou a ficar tudo cinzento.

Antes de iniciarmos a travessia da Serra Fina invertida tínhamos planejado acampar no cume do Capim Amarelo, porém o acampamento do primeiro dia , antes dos Três  Estados, ferrou toda a nossa logística. Não tínhamos conseguido acampar nos Três Estados no primeiro dia, e não tínhamos conseguido acampar na Pedra da Mina no segundo dia, já que estávamos cerca de 2 horas atrasados na caminhada. Então, certamente não conseguiríamos acampar no cume do Capim Amarelo também. Motivo pelo qual o Maracanã foi o nosso objetivo do dia. E acertadamente.

A trilha até o Maracanã é mais leve que a dos dias anteriores, porém não tem nada de fácil, pois é muito longa. Se anda ora em trechos retos, ora em pequenas subidas, ora em pequenas descidas.

Quando descíamos o último vale que, pelo o que eu me lembre, foi a descida mais íngreme que pegamos, o Ramon, que ia a frente com a Dani, me gritou lá de baixo perguntando se estávamos na trilha certa. Verificamos o GPS e constatamos que a trilha correta estava paralela a que estávamos.  Ô mania de não checar o GPS .

Bom… Tivemos que subir tudo de novo e voltar até a bifurcação para pegar a trilha a direita.

Logo iniciamos uma longa descida.  A essa hora eu não aguentava mais andar. Sentia muita dor nas minhas costas e no meu joelho. A dor era tanta que eu acabei me esvaindo em lágrimas, sozinha, lá atrás, com meus passos  cada vez mais lentos. Não sei se o choro foi só pelas dores que me acometiam ou se também pela caminhada exaustiva do dia, que sugou todas as minhas forças.  Como foram sofríveis aqueles últimos metros.

Um pouco antes do Maracanã encontramos uma área bem grande que dá para acampar também, mas como não queríamos atrasar a nossa caminhada do último dia, prosseguimos até o nosso objetivo, onde chegamos as 16:45.

Na mesma hora, tiramos as mochilas e nos esparramamos todos no chão, acabados. Mas logo começamos a esfriar. Colocamos então roupas quentes e fomos armar a barraca.

Neste dia, apenas o Emerson ficou com Ramon fora da barraca ajudando no jantar.

Eu estava moída.  Pedi para a Dani colocar um monte de Salompas nas minhas costas, coloquei outro no meu joelho e me enfiei dentro do meu saco de dormir. Fiquei lá deitada esticando as minhas costas, esperando o jantar ficar pronto. A Dani ficou comigo. Depois que jantamos fomos logo dormir.

Acordei  no meio da noite tossindo muito e com o nariz trancado.  Tinha pego  a gripe da Dani. Coloquei uma pastilha para garganta na boca, para aliviar a tosse, mas não adiantou muito. Foi uma noite bem mal dormida.

4° Dia: Maracanã – Capim Amarelo – Toca do Lobo

Crista até a Toca do Lobo na travessia da serra fina invertida
Crista até a Toca do Lobo na travessia da serra fina invertida

Levantamos  cedo, por volta das 5:30 e as 6:30 já estávamos iniciando a trilha.

A trilha segue até o topo da montanha que se avista do acampamento, onde se pode avistar finalmente  o Capim Amarelo.  E ele estava lindo, sendo todo iluminado pelo sol enquanto o resto daquele vale permanecia no escuro. Tiramos algumas fotos e continuamos a caminhada.

Continuamos a caminhada em meio ao capim, até entrar na mata novamente, onde se inicia a subida do Capim Amarelo.

É muito importante ficar atento nessa parte. Nós ficamos conversando demais, nos distraímos demais e acabamos pegando uma outra trilha, a  direita. Só depois de algum tempo percebemos que estávamos descendo demais. Nessa hora já tínhamos entrado em outras trilhas e voltar à trilha certa não foi nada fácil. Sabíamos onde ela estava, mas não conseguíamos achar a trilha por qual descemos, que levava até ela.  Aquilo ali é cheio de trilhas. Um verdadeiro labirinto. Mais uma vez saímos da trilha por pura preguiça de verificar o GPS.

Depois de algum tempo perdidos, a Dani, nossa “vara-mato” encontrou a trilha certa e seguimos rumo ao topo do Capim Amarelo. Subida constante no meio da mata, bem íngreme,  com algumas clareiras pelo caminho, até chegar ao ponto onde só há capim, por onde se segue até o cume.

Chegamos ao cume as 9:00. O tempo estava mais que perfeito.   Olhamos para trás  e pudemos ver toda a cadeia de montanhas que havíamos percorrido no dia anterior, e  a linda Pedra da Mina toda imponente ao fundo. Foi a hora que veio a minha cabeça “porra… nós andamos tudo isso… nós estivemos lá em cima… que foda”… e não, não era minha primeira vez na travessia da Serra Fina, mas a sensação era essa, de como se fosse a primeira vez.  Eu posso ir a mesma montanha um milhão de vezes mas eu nunca consigo vê-la da mesma forma. Há sempre algo novo no ar, há sempre uma nova sensação, um novo olhar… isso é muito doido…

Tiramos algumas fotos, fizemos um lanche e logo iniciamos a nossa descida rumo a toca do lobo, as 9:20, momento em que comecei a sentir um pouco meu joelho.
A Dani estava se sentindo  meio mal, sem energia, provavelmente por causa da gripe forte que estava, e resolveu ir na frente, no ritmo dela, pois rende melhor nas descidas. Seguimos  atrás então, Emerson, Ramon e eu, mais afastada.

Apesar de ser o último dia e estar fazendo um sol de rachar,  não estávamos com pressa nenhuma de chegar. Fomos  devagar, apreciando tudo pelo caminho. Todos os contornos daquelas montanhas,  daquela crista, toda a bela paisagem que estava a nossa volta, o Marins, o Itaguaré (que se via longe), as flores branquinhas que aos montes enfeitavam a montanha… E quando chegamos lá embaixo, antes de entrar na mata, olhamos pra trás e nos despedimos da linda Serra Fina, prometendo  voltar em  2016.

Adentramos a mata  e  continuamos a descida, chegando à  Toca do Lobo as 12:30 e ao ponto onde o nosso resgate estaria nos esperando as 13:00.

Estávamos moídos, mas com a alma lavada. Foram 4 dias maravilhosos e cada um deles foi especial a sua maneira. Até mesmo o dia cinzento em que subimos a Pedra da Mina. Quer mais clima de montanha que aquele? Eu amo. =D

Planejamos acampar no cume do Pico dos Três Estado (primeira noite), Pedra da Mina (segunda noite) e Capim Amarelo (terceira noite), porém acabamos acampando sempre antes dos mesmos (base dos Três Estados,  Vale do Ruah e Maracanã). Devido ao grau de dificuldade da travessia da serra fina invertida, andávamos por cerca de 9 horas  e não chegávamos ao local de acampamento planejado. O adiantar das horas, bem como o elevado nível do nosso  esgotamento físico fazia-nos acampar sempre antes de subir os cumes desejados.

Fazer a travessia da Serra Fina invertida  foi desafiador. Já tinha ouvido falar que se tratava da rota mais difícil e, realmente, constatei isso. Hoje eu tenho uma outra visão da Serra  Fina pela rota normal.

Agradeço imensamente aos meus colegas de trilha pela parceria e por terem feito desta dura travessia um momento de contemplação entre amigos,  sem qualquer correria. Porque o que importa não é  passar por ali voando,  com o único propósito de quebrar records,  sem  ver, ouvir, ou sentir nada.  O que importa é aproveitar cada minutinho  em que estivermos lá, apreciando tudo a nossa volta e cada uma das sensações que só esses lugares mágicos conseguem nos proporcionar.


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